Após grave acidente, o mountain biker Ilson Júnior foi considerado tetraplégico. Mas voltou a pedalar e conta com a Cannabis para recuperar a alta performance
Poucos dias após dar início ao tratamento com Cannabis medicinal, Ilson Júnior notou que conseguia caminhar cerca de 20% mais rápido que antes. Para entender a grandiosidade desse feito, é preciso conhecer a trajetória deste ex-atleta profissional.
Pegar uma bicicleta e se enfiar em trilhas, subindo e descendo montanhas, sempre foi a paixão deste mineiro, desde muito jovem. Tanto que, aos 15 anos, já tinha definido que queria fazer isso profissionalmente, para o resto de sua vida.
Deu certo. Em 2008 conquistou seu primeiro título, e não parou mais. Chegou a alcançar a terceira colocação do ranking nacional de Mountain Bike. “Era preparo de super humano. Cheguei a pedalar 300 quilômetros em um dia. Participava de ultramaratona”, conta.
Um obstáculo inesperado
Até que alguém decidiu instalar uma cerca de arame cruzando uma das trilhas pela montanha que costumava utilizar. Descendo em alta velocidade, não deu tempo de fazer nada. Com o efeito chicote, sentiu o impacto no pescoço e, ao cair no chão, já não conseguia mais se mexer.
“Fiquei 40 minutos no chão. Um menino me achou. Foi um resgate complexo e cheguei no hospital 3 horas depois”, lembra. “Depois foram 22 dias na UTI, 23 dias no setor de neurologia. O diagnóstico de lesão completa e que eu nunca mais voltaria a andar ou me movimentar.”
Ilson estava tetraplégico, ou pelo menos era o que diziam os exames. “Eu sempre gostei das questões mentais. Sou praticante de yoga há mais de uma década, e comecei a treinar mentalmente”, relata.
“Eu imaginava os movimentos. Na UTI, entubado, sem nenhum movimento, eu fechava os olhos e imaginava que estava pedalando, andando, fazendo treino de academia. Imaginando os movimentos com riqueza de detalhes. Eu sempre me aprofundei sobre a prática de ioga. Sabia da importância de mandar as informações para o meu corpo para abrir esses caminhos.”
Contrariando as expectativas
Contrariando todos os prognósticos, em setembro de 2016, dois meses depois do acidente, já conseguia sustentar o pescoço em pé. Com cirurgias e rotina intensa de fisioterapia e treinos típica a um atleta de alto rendimento, com sete meses já conseguia andar sozinho. Um ano após o acidente, já arriscava as primeiras pedaladas.
“Não tem uma explicação definida. Uma lesão de alto impacto. Pra mim, duas coisas explicam: Deus, em primeiro lugar, e a segunda é a minha dedicação”, afirma. “O que tinha feito antes do acidente: 12 anos dedicado ao esporte de alto rendimento. Isso me ajudou muito e me trouxe o mind set de atleta de alta performance. De se superar. É isso o que eu faço todo dia e é o que ajudou muito na minha recuperação.”
“O fundamental foi a neuroplasticidade. Através do que eu penso e do que eu fiz. Meu corpo foi criando novos caminhos para ter esses movimentos”, continuou. “Eu tive uma lesão completa, só que através do que eu fiz e a memória muscular, a capacidade de um super humano que havia construído 12 anos antes do acidente, tudo isso colaborou para a criação de novos caminhos e para estar onde estou hoje.”
Hoje, se considera 85% recuperado. Consegue pedalar até uma hora seguida e até já fez uma trilha de 3 km pela montanha. Dirige, mora sozinho e trabalha como palestrante motivacional. Sua história virou até documentário, que pode ser acessado em seu site. No entanto, embora conte com todos movimentos, ainda há limitações, principalmente nos braços.
“As pernas estão quase igual que eram antes. Eu ando, mas tenho uma marcha que foi se adaptando. Andei do jeito que deu. Os preparadores dizem que não entendem como eu ando, porque uso músculos que não foram projetados para andar. Uma marcha readaptada pela neuroplasticidade.”
Seu caminhar é afetado principalmente por espasmos musculares que sentia ao fazer algum movimento, como ao se levantar. Como se fossem cãibras muito breves por todo o corpo, e precisava fazer um grande esforço para conseguir se movimentar normalmente. “Como se andasse com duas caneleiras de cinco quilos, uma em cada perna, mas anda.”
Cannabis medicinal
O medicamento alopático para esse fim, minimiza o espasmo, mas relaxa todos os músculos. Assim não consegue treinar e, assim, fortalecer seus músculos. É aí que a Cannabis medicinal entra na história.
“A Cannabis ajudou a soltar a musculatura. Vou andar agora, estou mais solto. Vou pedalar, eu consigo usar toda minha força muscular. A resposta do meu corpo está sendo incrível. Superando todas as expectativas. Foi muito rápido o resultado. Daqui um mês, a gente pretende tirar o medicamento, ficar só com o óleo”, acredita Ilson Júnior.
“A questão neurológica vai ficar melhor. O intuito do óleo é esse. Estou conseguindo deixar a musculatura mais dolorida, fazendo mais força. No outro dia eu consigo treinar com qualidade novamente.”
Aos 31 anos, sua meta agora é voltar a ficar 100% fisicamente e voltar a percorrer livremente as montanhas com sua bicicleta. “Meu objetivo não é voltar a competir, mas voltar a andar em alto nível. É o que eu mais amo e fiz por toda minha vida. Com minha bicicleta pelas montanhas.”