Leandro Neto – CEO da Health Meds no Brasil – é o convidado dessa semana para falar no quadro “O CEO Responde” sobre os desafios e as perspectivas de empreender no mundo canábico no Brasil. Neto é advogado especialista na área de Meio Ambiente, com pós-graduação em Direito Ambiental pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e pela Universidade de Lisboa (Portugal). O executivo, fundador do Escritório Rocha Neto Advogados Associados, e com ampla experiência no mercado farmacêutico, em 2019 decidiu empreender no admirável mundo novo da Cannabis e fundou a Health Meds – uma indústria brasileira especializada em produtos à base de canabinoides. Com laboratório próprio na Flórida (EUA), a empresa investe forte em pesquisas e estudos científicos para desenvolver linhas exclusivas com certificados de boas práticas de fabricação e todos os protocolos sanitários exigidos pela Food Drug and Administration (FDA) – uma espécie de Agência Reguladora norte-americana. Recentemente, a Health Meds anunciou acordo de venda de 10% da empresa para o grupo Profarma, uma das maiores redes farmacêuticas do país. A nova parceria é uma estratégia de posicionamento do produto, que muito em breve estará disponível aos pacientes nas farmácias de todo país. Com a palavra, Leandro Neto:
A Health Meds é um player importante no mercado brasileiro da Cannabis.
Já sabemos quando o produto da Health Meds (com canabinoides) vai chegar nas prateleiras das farmácias de todo país?
Iremos ter os produtos nas farmácias em breve. Nossa expectativa é de que no primeiro trimestre de 2023 teremos nossa formulação nas prateleiras. Enquanto isso, trabalhamos com o viés da importação. A Health Meds é uma indústria farmacêutica especializada em produtos à base de canabinoides. Entendemos que esse é um mercado que demanda ciência fundamentada, pesquisas e capacitação médica. Com evidências, esse mercado vai ganhar musculatura. O nosso diferencial é ter laboratório próprio. Por isso, nossas apresentações são exclusivas e possuem todas as certificações. Entramos de forma diferenciada no mercado. Temos compromisso com o viés cientifico e acadêmico, fomentando a pesquisa e a ciência – que são os principais pilares desse negócio. Para nós, esse é o caminho.
Qual é a demanda esperada?
Ainda não temos um número fechado. No mês de junho (2022), a empresa importou entre 700 a 800 remessas com cargas de até 80 frascos. Já é um volume interessante com pouco mais de três anos no mercado. E esse número vem crescendo paulatinamente. Lembrando que esse dado diz respeito apenas à importação. Prevemos um crescimento exponencial e muito importante a partir do desenvolvimento de pesquisas e comprovação científica.
Como a empresa avalia a entrada de novos medicamentos no mercado? A concorrência é algo saudável para o setor?
A concorrência sadia amplia a democratização e o acesso aos medicamentos a partir da ampliação da oferta e a redução o valor do produto. Mas, para que esses produtos cheguem até às farmácias são novos desafios. Dos 19 produtos com autorização, pouquíssimos já estão sendo comercializados nesses pontos de venda. Existe uma dificuldade de ultrapassar esse gap. As exigências são muitas. E já pensando nas farmácias, buscamos um grande parceiro, o grupo Profarma, que vai agregar valor ao planejamento de expansão. Nesse cenário, com diversas opções de produtos, as pessoas precisam entender os diferenciais de cada um deles. Temos as nossas formulações próprias e exclusivas. Queremos atender às demandas e necessidades médicas, porque afinal são eles que prescrevem. Com comprovação científica vamos aprovar cada vez mais formulações.
Hoje, qual é o tamanho do mercado nacional?
Não temos um número fechado. O tamanho do mercado equivale às patologias que podem ser tratadas com os canabinoides. Por exemplo, se dermos foco às patologias ligadas a neurociência – onde há maior evidência – podemos atender aos pacientes que sofrem com autismo, Alzheimer, dor crônica. Há ainda outras indicações para patologias como síndrome do pânico, insônia e ansiedade. Em cima dessas premissas, podemos atender todo esse rol de pacientes. A demanda vem aumentando, assim como a quantidade de médicos que estão prescrevendo. Estamos bastante otimistas.
Qual é o perfil do paciente brasileiro?
Não há um perfil concreto, é muito eclético. Atendemos pacientes que vão desde bebês com epilepsia, crianças com autismo, até idosos com Alzheimer e Parkinson. Mesmo os produtos não sendo fornecidos pelo SUS (Sistema Único de Saúde) na maioria dos estados, já estamos atendendo várias ações judiciais nesse sentido. Hoje, atendemos por demanda a importação de pessoas físicas, demandas judiciais, processos licitatórios e planos de saúde. Posso dizer, seguramente, que já fornecemos fitofármacos para todos os planos de saúde do Brasil, para pelo menos, 50 operadoras de saúde. Além disso, fornecemos para muitas Secretarias de Saúde nos municípios e Estados e até para o próprio Ministério da Saúde, para a Aeronáutica e para o Exército, que chegou a abrir um processo de licitação bem específico para o fornecimento de canabidiol.
Hoje, qual é o produto carro-chefe da Health Meds? A empresa estuda a possibilidade dispensar outros tipos de canabinoides como o CBN, CBG, CBC…?
Temos cinco produtos que estão sendo comercializados atualmente com CBD, THC e CBG. Nós fomos a primeira empresa a trazer o canabigerol (CBG) para o Brasil. Essa é a vantagem de ter laboratório próprio. Não focamos só em THC e CBD, porque na Europa já existem evidências científicas de que os canabinoides menores têm importância no uso medicinal. O produto com canabigerol é uma formulação que se destaca, porque essa é uma molécula anti-inflamatória. Os médicos têm gostando dessa apresentação, é uma novidade muito procurada. Já estamos produzindo outras formulações no nosso laboratório na Florida. É um arsenal terapêutico desenvolvido para suprir às necessidades que hoje não são atendidas pelo mercado. Já adiantando uma novidade, estamos desenvolvendo uma fórmula exclusiva para distúrbio do sono, com canabinoides menores como o canabigerol, canabinol e o canabicronemo, por exemplo. Projetamos uma demanda alta por esse tipo de formulação.
Quais são as pesquisas que a Health Meds vem desenvolvendo nesse momento relativas à Cannabis?
Nosso foco é na neurociência. Não posso dizer muita coisa por causa das regras de complaince. Mas posso adiantar que estamos trabalhando com cinco frentes de pesquisa que estão em via de aprovação. Uma dessas linhas de pesquisa, que já está aprovada, é para enxaqueca crônica. Muito em breve vamos começar a recrutar pacientes. O restante, ainda em análise pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). É importante dizer que 25% do nosso faturamento é voltado só para o desenvolvimento de pesquisas científicas. Esse modelo é parecido com o modelo das grandes multinacionais, que investem pesado em pesquisa para criar evidências científica.
Qual é o maior desafio de empreender hoje – em Cannabis – no Brasil?
Empreender no Brasil já é uma luta, é um grande desafio em qualquer área. Na Cannabis há uma necessidade alta de investimentos para colocar em práticas as ações exigidas pela Anvisa, além do trâmite para implementar e desenvolver pesquisa e ciência. Essa é uma barreira em toda indústria farmacêutica, principalmente na área de saúde que desenvolve produtos. Existem outros desafios de empreender no Brasil que são de praxe, como o número elevado de impostos, a instabilidade econômica do país e a burocracia. De volta ao mercado da Cannabis, eu posso destacar com toda tranquilidade, que a maior dificuldade é a falta de conhecimento médico sobre o Sistema Endocanabinoide. Especificamente na área de Cannabis, precisamos capacitar os médicos.
Quantos empregos diretos e indiretos a Health Meds gera no Brasil e fora do país?
No Brasil, geramos 60 empregos diretos e lá fora, cerca de 80 profissionais. Em empregos indiretos é difícil contabilizar porque a cadeia produtiva da Cannabis é complexa e extensa.
O senhor acredita que é importante autorizar e regulamentar o cultivo da Cannabis no Brasil?
Esse movimento é importante. Qualquer movimento que traga desenvolvimento e democracia para o nosso país, eu sou a favor. Entretanto, para nós, da Heath Meds, não faz muita diferença liberar o cultivo, porque o impacto na nossa indústria não é tão relevante. O nosso custo com insumo representa apenas 15% do total. Agora, entendo que necessitamos de um amplo debate. É importante e relevante falar sobre cultivo, mas envolvendo toda a cadeia produtiva da planta, inclusive o uso industrial. Quando falamos da área de saúde, a demanda é por uma matéria-prima de excelência. Então, precisa ter qualidade, controle, segurança e suporte. Isso não é barato. A Health Meds cuida de toda essa cadeia produtiva nos Estados Unidos, desde o cultivo, à extração, ao encaminhamento para o laboratório, a separação de moléculas, o envase, a rotulagem e a distribuição.
Hoje, já se fala em medicina “on demand”. As farmácias de manipulação são importantes nesse cenário? A empresa tem perspectiva de atuar nesse nicho?
As farmácias de manipulação têm um papel importante na saúde. Mas, quando a gente fala de canabinoides, a Anvisa proíbe a manipulação dessas moléculas. Tanto que exige estudo de estabilidade para alcançar o grau farmacêutico, a precisão, assegurar a procedência, segurança e eficácia. Atuar nesse ramo não está no nosso nicho. Todos os nossos produtos são fitofármacos, são produtos farmacêuticos com alto nível de tecnologia e precisão na extração de canabinoides, segurança, procedência e qualidade.

Como trabalhar propaganda e informação sobre a Cannabis sem violar as regras que limitam esse tipo de ação?
A Health Meds trabalha do mesmo modo que a indústria farmacêutica atua para divulgar pesquisas entre a classe médica. Apresentamos resultados em que a ciência já evidenciou de forma ética. Uma das nossas estratégias de divulgação do nosso trabalho é promover eventos científicos. Nossos médicos destrincham pesquisas científicas e propagam para o meio médico. Estamos sempre fomentando a ciência. Tudo alinhado às políticas de complaince da empresa e às regras da Anvisa.
Existe a previsão de fornecer formação continuada aos médicos brasileiros?
Todos os envolvidos no setor que tiverem interesse em apoiar e fomentar pesquisa e educação médica continuada, nós iremos apoiar. Todos os que quiserem trabalhar de mãos dadas, temos interesse em fazer parceria. Produzimos materiais técnicos e didáticos para entregar aos médicos, o que é permitido pela Anvisa. Também lançamos a calculadora digital para ajudar os médicos a prescrever a quantidade correta de canabinoides, de acordo com a patologia. Fizemos isso porque percebemos uma quantidade enorme de produtos com baixas dosagens e concentrações quebradas. Isso traz confusão para a classe médica que pode estar prescrevendo uma subdosagem. Nossa calculadora chega para somar. É um desafio para o médico trabalhar com formulações quebradas, sem padronização. A capacitação médica é fundamental.
Se, hoje, o senhor pudesse fazer um pedido à Anvisa qual seria ele?
Primeiro, nós temos que destacar o excelente trabalho que a Anvisa vem desempenhando. Até 2015 não havia nenhum ato normativo que pudesse liberar a entrada de medicamentos à base de canabinoides no Brasil. Esse trabalho é significativo. A Anvisa criou uma norma para importar, incialmente, e vem aprimorando o texto de forma reiterada. Em 2019 veio a RDC 327, que permite colocar os produtos nas farmácias. Está avançando. Agora, se eu pudesse fazer um pedido à Agência, seria no sentido de a Anvisa aprovar uma regulação mais específica, no que diz respeito às concentrações, justamente para estabelecer uma base de padrões terapêuticos. Minha preocupação são as empresas que entram no mercado com dosagens quebradas. Além de dificultar a vida do médico, isso traz resistência para quem quer aprender a prescrever. Uma regulação mais específica traria um ganho expressivo para o mercado.
Qual é o grau de satisfação em relação à regulamentação sobre Cannabis existente hoje no Brasil?
Muito satisfeito. Claro, há o que melhorar. A Anvisa teve a sabedoria de criar prazos para as revisões das normas. A Agência está aprendendo com o mercado, abrindo espaço para que as pessoas envolvidas possam opinar. É um trabalho de várias mãos. Uma forma democrática, que ouve todos os envolvidos e lados. Mas ainda está tudo muito no começo. Foi um grande passo da Anvisa regulamentar o uso medicinal da Cannabis. Agora, ganhando experiência, observando o aumento de demanda, o comportamento do mercado, certamente a Anvisa vai buscar aprimorar ainda mais a regulação.
O que falta para o mercado brasileiro expandir?
O mercado brasileiro está em processo de amadurecimento. Tem expandido, não há dúvidas. Sem ser repetitivo, reforço a importância que deve ser dada à ciência. Esse é o diferencial que o mercado da Cannabis precisa para que haja expansão. Pesquisa, desenvolvimento científico e educação médica continuada. Esse é o caminho.
O que não pode faltar no empreendedorismo canábico?
Vontade, resiliência e o compromisso com a ciência. O mercado da Cannabis é enorme, abrange desde vestuário até alimentos. Acho importante atuar onde há evidências para substituir produtos por outros já existentes ou sermos protagonistas. Mas na área da saúde, principalmente, existe a necessidade de se criar mais evidências científicas. Não bastam indícios. Somente por meio da ciência conseguiremos quebrar paradigmas e tabus.
O que motivou a empresa a investir no mundo da Cannabis?
Ajudar a trazer mais qualidade de vida para as pessoas. Há um propósito nesse mercado.
Como que a empresa se vê daqui a 5 anos?
Como um dos maiores players do Brasil e conquistando o mercado em toda América Latina.