Na coluna “O CEO Responde” dessa semana conversamos com o Ricardo Pettena – Diretor Executivo da Carmen’s Medicinals no Brasil. O executivo, com 25 anos de experiência no mercado de saúde, já atuou em posições de liderança de grandes multinacionais como como a Sanofi, Merck Sharp& Dohme e Boston Scientific. Desde 2020, Pettena assumiu o desafio de conduzir a empresa no país e tornar o acesso aos produtos à base de Cannabis mais democrático. A Carmen’s Medicinals nasceu em 2018 nos Estados Unidos, quando Juan Romero conheceu as propriedades medicinais da Cannabis no tratamento de câncer da avó que deu nome à marca. Desde então, a empresa – que possui cultivo próprio em terras norte-americanas e na Colômbia – trabalha para desenvolver produtos de alta qualidade e promover o acesso à terapia canabinoide, proporcionando saúde e bem-estar para aqueles que precisam.
A Carmen’s Medicinals chegou com força no mercado brasileiro da Cannabis.
Podemos esperar, em breve, o produto da Carmen’s Medicinals (com canabinoides) nas prateleiras das farmácias?
Vamos investir em todas as oportunidades proporcionadas pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). Hoje, operamos com base na Resolução nº 335 – que define critérios e procedimentos para importação de produtos derivados de Cannabis por pessoa física. Já há pesquisas em curso para atuarmos com produtos nas farmácias. O mercado ainda está muito imaturo no que tange a parte científica. A Cannabis possui mais de 140 canabinoides e hoje são usados praticamente 4 (tetrahidrocanabinol – THC e canabidiol – CBD, canabigerol CBG e canabinol CBN). Estudos são necessários e a indústria tem o papel e dever de fomentar o desenvolvimento científico. Com relação a regulamentação RDC (Resolução da Diretoria Colegiada) nº 327 da Anvisa, penso que foi um grande avanço mas ainda tem dificultadores, porque a cada novo produto registrado é preciso comprovar estudos de estabilidade de no mínimo 12 meses.
Qual é a demanda esperada?

A expectativa da Carmen’s Medicinals está alinhada com uma visão: temos a missão de aumentar o acesso ou ser uma empresa facilitadora do acesso aos medicamentos da Cannabis no Brasil para os que precisam. Há uma grande diferença entre o discurso e a prática na implementação real dessa visão. E qual é a principal diferencial? Nós praticamos a missão, vendemos nossos produtos com preços bem acessíveis. Por exemplo, nosso óleo de entrada custa R$ 331 reais, isso fez com que o próprio mercado se visse obrigado a ajustar seus preços, isso é o tipo de impacto positivo que a Carmen’s Medicinals quer causar no mercado, esse é o nosso propósito. No Brasil praticamos preços menores daqueles que praticamos nos Estados Unidos. Vendemos nossos produtos em real e nunca oscilamos o preço, pois entendemos que isto é mais justo para o paciente. Começamos o nosso negócio uma semana antes da pandemia. Isso travou o trabalho por quase um ano, porque não era possível visitar médicos, fazer o corpo a corpo. Apesar de difícil, foi um tempo importante para o amadurecimento da empresa.
Como a empresa avalia a entrada de novos medicamentos no mercado? A Anvisa já autorizou a comercialização de 20 produtos nas drogarias. A concorrência é algo saudável para esse mercado da Cannabis?
Com relação a questão “preço e qualidade” a concorrência é sim muito benéfica para o mercado e para os pacientes. Mas o mercado da Cannabis está iniciando, estamos no momento de expansão, neste aspecto não vejo as outras empresas como “concorrentes”, ao contrário, as vejo como “parceiras” na missão de levar conhecimento científico à classe médica a fim de desenvolver prescritores conscientes e preparados. No Brasil, há mais de 500 mil médicos, e aproximadamente menos de 3.000 deles são prescritores. As empresas juntas são responsáveis por levar informação ao médico com segurança. As empresas sérias, que atuam no mercado, devem estar preocupadas em atuar de forma positiva. Eu considero concorrentes dezenas de outras empresas que vendem óleo de qualidade questionável, sem análise laboratorial (COA), e responsabilidade. Isso traz descrédito à terapia. A titulação errada, ou um produto sem qualidade e sem as substâncias que diz conter, podem gerar subdosagem e frustração em relação a terapia. Este sim é um risco para pacientes e para o mercado.
Hoje, qual é o tamanho do mercado nacional na avaliação do senhor?
Neste momento não me prendo a números, pois eles ainda vão mudar muito. A cada nova indicação clínica, há um potencial maior de aplicação e o mercado aumenta. Nosso foco é: quantos médicos ainda não conhecem a terapia e podem aprender? Focando nas patologias que podem ser tratadas com os canabinoides chegaremos aos números e na expectativa de demanda.
Qual é o perfil do paciente brasileiro?
Hoje, este perfil está cada vez mais diverso. Quando a terapia teve início ganhou força entre as doenças infantis, agora o mercado que mais cresce é o de dor crônica e atinge, de forma mais prevalente, os adultos. Além das indicações mais tradicionais como autismo, epilepsia e ansiedade estão surgindo novas patologias que podem ser tratadas com a Cannabis, como a endometriose, a enxaqueca e outras mais. Seguiremos o caminho da ciência, respeitando o que dizem os médicos em sua experiência clínica e os pesquisadores. O nosso foco não é no dinheiro, mas no número de pessoas que podemos ajudar.
Hoje, qual é o produto carro-chefe da Carmen’s Medicinals? A empresa estuda a possibilidade dispensar outros tipos de canabinoides como o CBN, CBG, CBC…?
Não temos um produto carro-chefe. Temos várias apresentações e estamos ampliando ainda mais com objetivo de oferecer aos médicos um amplo arsenal de possibilidades para que eles possam atender às necessidades de cada paciente. Nossos óleos full spectrum têm um valor mais em conta e são portas de entrada para o paciente. O importante é que prezamos pela qualidade, desenvolvemos produtos formulados com o que há de melhor em termos de terpenos e canabinoides. O resultado é um produto de qualidade. Por exemplo, nossas gomas foram classificadas pela revista Forbes como a 5º melhor dos Estados Unidos numa avaliação entre outras 50 marcas. Também já temos produtos com CBG, CBN e THC em alta concentração.
Quais são as pesquisas que a Carmen’s Medicinals vem desenvolvendo nesse momento relativas à Cannabis?
Temos vários projetos de pesquisa e ensaios clínicos em desenvolvimento em hospitais e alguns estados do Brasil. Esperamos a conclusão destes estudos até o final de 2023.
Qual é o maior desafio de empreender hoje – em Cannabis – no Brasil?
Os enormes custos de impostos gerados pela burocracia. Além disso, o mercado financeiro e logístico são dois dos maiores dificultadores desse mercado. Se negam a aceitar pagamentos, abrir contas ou transportar produtos de Cannabis Medicinal. Para mim, é lamentável a postura nada inclusiva das empresas que atuam nesses segmentos, e só reforçam a criminalização irresponsável de um medicamento essencial para milhares de pacientes. Esta postura onera a cadeira, dificulta o acesso e penaliza o paciente.
Quantos empregos diretos e indiretos a Carmen’s Medicinals gera no Brasil?
58 empregos diretos no Brasil. É difícil contabilizar a quantidade de empregos indiretos.
O senhor acredita que é importante autorizar e regulamentar o cultivo em solo brasileiro?
Apoiamos a legalização do plantio para fins medicinais e industriais, muito embora para a Carmen’s não seja uma oportunidade, pois já temos cultivo nos Estados Unidos e na Colômbia. A expectativa é de que o plantio gere redução de custo, mas a experiência do mercado mostra que não necessariamente reduz o valor do produto final, por ser uma commodity industrial com seu preço em dólar como acontece com outras commodities. Mas o cultivo pode sim ser muito positivo para o mercado inclusive com a produção de cânhamo para fins industriais. Já a área medicinal, não seria tão impactada na minha visão. Entendo que a redução de impostos e a flexibilização para se ter estoque de produto acabado no Brasil, antes de ter registro na Anvisa, poderia impactar na redução do valor final do produto, principalmente considerando que hoje o preço do frete, por exemplo, é um empecilho e um custo adicional para o paciente. O nosso frete é um dos mais baratos do mercado no Brasil, mas ainda assim é um custo. Além disso, é importante dizer que o cultivo da planta para fins medicinais não é algo simples e nem barato, principalmente para produzir flores para medicamento. Por outro lado, não existe justificativa técnica para a criminalização dessa planta.
Hoje, já se fala em medicina “on demand”. As farmácias de manipulação são importantes nesse cenário? A empresa tem perspectiva de atuar nesse nicho?
Economicamente ainda é um desafio, mas cientificamente é interessante. Somos seres biologicamente e quimicamente individuais. O Sistema Endocanabinoide é quase uma impressão digital. Então, a medicina “on demand” é interessante e bem vista. Já as farmácias de manipulação têm a sua importância desde que estejam debaixo das mesmas regras das demais empresas. Por exemplo: as farmácias de manipulação poderiam produzir qualquer formulação sem controles de qualidade, e as empresas têm custos para realizar estudos de estabilidade de no mínimo 12 meses para registrar na Anvisa? É preciso haver uma equiparação de direitos e deveres entre as farmácias comuns, as magistrais e as empresas que vendem produtos acabados.
Como trabalhar propaganda e informação sobre a Cannabis sem violar as regras que limitam esse tipo de ação?
O desafio é trabalhar a desinformação. A Cannabis segue a RDC de produtos controlados, mas no meio do caminho há uma série de dúvidas. A BRCANN – que representa mais de 20 empresas do setor – está buscando estabelecer essa conexão com a Anvisa para que haja uma definição clara das regras de complaince. É importante definir com clareza o que pode ou não ser feito, e fiscalizar para que as empresas sigam as regras – um único código de conduta.
Existe a previsão de fornecer formação continuada aos médicos brasileiros?
Sim! Formação continuada por meio de lives, congressos e seminários. Além da distribuição de material impresso com informações técnicas e científicas. A nossa ideia é fazer parceria com empresas que já disponibilizam cursos e formação médica.
Se, hoje, o senhor pudesse fazer um pedido à Anvisa qual seria ele?
Penso que a Anvisa tem feito um bom trabalho. Mas o meu pedido seria para acelerar o processo de fiscalização e liberação das remessas para que o paciente possa ter acesso ao medicamento de forma mais ágil. Em 48 horas o nosso produto sai dos Estados Unidos e chega ao Brasil, mas fica parado nos órgãos de controle de 15 a 30 dias. Entendo que é importante ter um filtro apertado para empresas que estão iniciando, mas para as empresas que já estão operando de forma correta – sem intercorrências na Anvisa – deveria existir uma espécie de meritocracia para facilitar o processo de quem já está no mercado cumprindo todas as exigências no país.
Qual é o grau de satisfação do senhor em relação à regulamentação sobre Cannabis existente hoje no Brasil?
Considero a regulação da Anvisa boa, pois estimula um padrão de qualidade e tenta evitar o comércio de produtos sem qualidade no mercado. Isso protege os pacientes. Mas a forma de desembaraço precisa melhorar, ser mais ágil. Entendemos que o processo é rígido porque se trata de um medicamento controlado. O mercado muito aberto e sem controle também é ruim, entra qualquer um, produtos sem qualidade que podem colocar os pacientes em risco. Se reduzisse o tempo de liberação aduaneira para três dias seria um grande avanço. Em cinco dias o medicamento já estaria na mão do paciente.
O que falta para o mercado brasileiro expandir na opinião do senhor?
Educação e formação médica.
O que não pode faltar no empreendedorismo canábico?
Propósito e determinação.
O que motivou a empresa a investir no mundo da Cannabis?
O desafio de começar uma empresa num mercado cheio de propósito. Algo novo e diferente da indústria farmacêutica. Queremos gerar impacto significativo.
Como que a empresa se vê daqui a 5 anos? E em 10 anos, onde quer chegar?
Em cinco anos, queremos estar entre as cinco mais importantes empresas de Cannabis do Brasil e da América Latina, já presentes no mercado europeu. Em dez anos, pretendemos ser um grande grupo. O mercado vai se consolidar e seremos um player importante neste momento.
Cite três empresas especializadas em Cannabis que são destaque na opinião do senhor.
No Brasil, obviamente Carmen’s Medicinals e também a TegraPharma, GreenCare.