No quadro “O CEO Responde” dessa semana, a conversa foi com o Matheus Patelli, atual Diretor Executivo da HempMeds no Brasil. Fundada em 2012 nos Estados Unidos, a empresa norte-americana é uma subsidiária da multinacional Medical Marijuana, Inc. Com forte atuação nas Américas, a companhia possui escritórios nos Estados Unidos, México e Brasil. A empresa, que planeja expandir os negócios em toda América Latina, é pioneira em conseguir autorização da Anvisa (Agência nacional de Vigilância Sanitária) para importar produtos à base de Cannabis no Brasil. A aposta da multinacional neste ano é investir em pesquisas que possam subsidiar o uso de canabinoides nos esportes e no patrocínio de atletas que fazem uso da Cannabis, usando como gancho a desclassificação do canabidiol (CBD) como doping nas competições mundiais. Para Patelli, contar com a ajuda de pessoas públicas para quebrar paradigmas e desinformação é fundamental num mercado ainda cercado de preconceitos. Antes de assumir a Diretoria Executiva da empresa, Patelli atuou na HempMeds como gerente de marketing, além de ter ocupado postos na área comercial e de operações. Matheus também já esteve à frente de cargos estratégicos em outras importantes organizações do Brasil, incluindo Ambev e a Câmara Americana de Comércio, Amcham-Brasil.
A HempMeds é pioneira no mercado brasileiro da Cannabis.
Podemos esperar, em breve, o produto da HempMeds nas prateleiras das farmácias?
Sim. Já estamos nos preparando com o apoio de um braço farmacêutico – a HM Farma. Muito em breve vamos posicionar nossos produtos nas farmácias. A expectativa é de que no primeiro semestre de 2023 os produtos já estejam disponíveis para os pacientes de todo país.
Qual é a demanda esperada?
A gente ainda não tem uma previsão. Mas de acordo com o histórico de importação desde 2015, a gente entende que parte dessas aquisições vão ser atendidas pelo mercado farmacêutico.
Como a empresa avalia a entrada de novos medicamentos no mercado? A Anvisa já autorizou a comercialização de 19 formulações nas drogarias. A concorrência é algo saudável para esse mercado da Cannabis?
A concorrência é extremamente saudável para esse mercado pensando na acessibilidade que o paciente deve ter. Quanto mais produtos, maior a diversidade de possibilidades e de tratamento. Além disso, as empresas também vão precisar fazer uma diferenciação de marca ou de preço. Isso vai facilitar a compra para os pacientes.
Hoje, qual é o tamanho do mercado nacional na avaliação do senhor?
Algo em torno de 4% do mercado farmacêutico brasileiro sendo “abocanhado”, vamos dizer assim, pelo mercado da Cannabis. Isso já é um volume enorme. Então, se a gente considerar 2% já é um tamanho muito razoável para só um tipo de produto.
Qual é o perfil do paciente brasileiro?
Esse perfil mudou muito. Entre 2015 e 2018, de 70 a 80% dos pacientes da Cannabis eram de crianças com síndromes raras. Hoje, esse perfil mudou bastante. Nesses últimos quatro anos essa curva foi invertida. Agora, cerca de 70% dos pacientes são adultos que estão em busca de produtos para ansiedade, depressão e alguns transtornos neurológicos.

Hoje, qual é o produto carro-chefe da HempMeds? A empresa estuda a possibilidade dispensar outros tipos de canabinoides como o CBN, CBG, CBC…?
Os dois produtos carro-chefe da HempMeds é um isolado de 6000 mg de CBD em 30 ml e um produto full spectrum 5000 mg de CBD em 236 ml. Muito em breve nós estaremos lançando um novo produto full spectrum com uma concentração similar ao isolado. A gente aposta que esse será um elemento chave para o nosso mercado. Sobre os demais canabinoides, a gente já dispensa produtos como o canabigerol (CBG) e canabinol (CBN) pela via de importação. Esses produtos também têm uma procura muito grande.
Quais são as pesquisas que a HempMeds vem desenvolvendo nesse momento relativas à Cannabis?
A gente tem pesquisas para compreender melhor o funcionamento do Sistema Endocanabinoide. São pesquisas pré-clínicas que estão sendo feitas na UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Temos outras pesquisas vinculadas a universidades norte-americanas, estudos relacionados à aplicação de CBD para traumatismo craniano. Também temos alguns protocolos observacionais com atletas relacionando o uso do medicamento à performance e a melhoras de alguns atributos. Esses estudos também estão sendo conduzidos por médicos no Rio de Janeiro.
Qual é o maior desafio de empreender hoje – em Cannabis – no Brasil?
No modelo compassivo temos burocracias relacionadas a algumas travas operacionais como questões tributárias e aduaneiras. Não poder ter estoque no Brasil dificulta o processo. A questão da liberação das cargas nos aeroportos demora bastante. Então, a burocracia é um entrave. Quando a gente fala do mercado de dispensação em farmácia, sem sombra de dúvidas, o alto custo ainda é um desafio. Hoje, ainda não existe a possibilidade do plantio no Brasil, então toda a matéria-prima vem de fora e isso eleva o custo do produto final. Além disso, temos que cumprir uma série de exigências para que o produto seja aprovado pela Anvisa, o processo ainda é lento. Se a gente for resumir, no mercado compassivo – na via de importação – o principal desafio é a burocracia. Na dispensação em farmácias, o principal entrave é o custo.
Quantos empregos diretos e indiretos a HempMeds gera no Brasil e fora do país?
Geramos 22 empregos diretos no Brasil e indiretos estamos falando de praticamente 50 pessoas. Internacionalmente, a HempMeds chega a ter chega mais de 100 funcionários diretos. Somos parte do grupo Medical Marijuana, Inc que tem negócios globais.
O senhor acredita que é importante autorizar e regulamentar o cultivo em solo brasileiro?
Sem sobra de dúvidas. Isso desenvolve um novo mercado, porque não falamos simplesmente de produtos de Cannabis para fins medicinais. É possível usar várias partes da planta para outros mercados fins, como por exemplo: engenharia, agricultura, alimentação, suplementação, cosméticos, mercado pet, têxtil e por aí vai. Então, tem uma série de outros mercados que podem ser desenvolvidos a partir desse cultivo.
Hoje, já se fala em medicina “on demand”. As farmácias de manipulação são importantes nesse cenário? A empresa tem perspectiva de atuar nesse nicho?
Quanto mais canais de venda estiverem acessíveis à sociedade melhor. As farmácias de manipulação são sim importantes nesse cenário, ficando a critério do médico entender como ele vai compor essa fórmula. Claro que precisa de um rigor sobre a matéria-prima que está sendo utilizada e como o produto será manipulado. De qualquer forma, imagino que esse seja um interesse do mercado como um todo.
Como trabalhar propaganda e informação sobre a Cannabis sem violar as regras que limitam esse tipo de ação?
Esse é um fator muito limitante no nosso mercado. A gente acaba atuando numa zona cinzenta, porque depende da interpretação da Anvisa sobre o que é propaganda. Nossa comunicação sempre visa conteúdo, informação, desmistificar o tema, derrubar mitos, apontar verdades. E a gente usa canais proprietários digitais como redes sociais, o próprio site, eventos para os médicos, para a sociedade e lives.

A gente se apoia muito em pessoas públicas que nos ajudam a levar essa mensagem, principalmente atletas. Recentemente, a gente desenvolveu um podcast com atletas, o “Podio Cast”. Nesse espaço, estamos recebendo atletas que são patrocinados pela empresa ou outros atletas que fazem uso desses produtos para falar um pouco sobre a vida deles e também sobre o tratamento. Isso ajuda a amplificar a voz desse mercado.
Existe a previsão de fornecer formação continuada aos médicos brasileiros?
Essa formação já acontece. As empresas fornecem cursos, assim como as associações e as próprias instituições de ensino. A USP (Universidade de São Paulo), por exemplo, oferece um curso de curta duração relacionado à medicina canabinoide que vem sendo o mais procurado em 2022. É um curso que a gente apoia. Agora um passo muito importante é conhecer melhor o Sistema Endocanabinoide. Esse assunto precisa ser incorporado de forma continuada na grade curricular de diversas áreas de saúde, como medicina, nutrição, fisioterapia, odontologia e veterinária.
Se, hoje, o senhor pudesse fazer um pedido à Anvisa qual seria ele?
Que nós pudéssemos fazer estoque de produtos do mercado compassivo no Brasil, para atender a uma série de situações críticas de pacientes que, às vezes, estão sem produtos – com crises convulsivas – e precisam de um resgate rápido.
Qual é o grau de satisfação do senhor em relação à regulamentação sobre Cannabis existente hoje no Brasil?
Eu acredito que a gente está no meio do caminho. Então, de zero a cinco, eu daria nota três. Algumas flexibilizações já aconteceram desde 2015 quando a importação da Cannabis começou a ser regulamentada no Brasil, mas ainda há muito a ser feito para que possamos chegar no modelo ideal.
O que falta para o mercado brasileiro expandir na opinião do senhor?
Menos ceticismo, menos burocracia e um olhar mais humano para esse mercado.
O que não pode faltar no empreendedorismo canábico?
Seriedade e ciência baseada em evidência.
O que motivou a empresa a investir no mundo da Cannabis?
A HempMeds existe desde 2012 nos Estados Unidos. Já o grupo Medical Marijuana, Inc trabalha com esses produtos desde 2008. Então, o que a empresa fez foi investir nesse mercado no Brasil visando atender à necessidade de famílias em situações críticas que precisam lidar com síndromes raras. O nosso produto chega ao Brasil para ajudar cada vez mais pessoas e democratizar ao acesso à medicação.
Como que a empresa se vê daqui a 5 anos? E em 10 anos, onde quer chegar?
Entendemos que esse mercado estará muito mais maduro no Brasil em cinco anos, com outras frentes de negócio operando como as farmácias de manipulação, a dispensação em drogarias, o mercado pet, e quem sabe, suplementos e outras linhas de mercado que a própria Cannabis pode possibilitar. Em 10 anos, a gente pretende exportar esse modelo para diversos outros países.
Cite três empresas especializadas em Cannabis que são destaque na opinião do senhor.
Em relação a produtos, eu cito a própria HempMeds que foi a pioneira a chegar no Brasil e trazer esses produtos de maneira legalizada. Até hoje somos sinônimo de qualidade e líder no mercado. Outra empresa de destaque é a Cannect que vem fazendo um trabalho de inovação tecnológica muito relevante, criando uma farmácia com dispensação única e exclusiva para produtos de Cannabis. Além de ser um marketplace que vem fazendo um acolhimento muito interessante no mercado brasileiro como um todo. Cito ainda o Portal Cannabis & Saúde, pela sua relevância, por levar informação de qualidade sobre esse mercado para toda a sociedade.