Em nota oficial divulgada nesta semana, o Conselho Federal de Odontologia (CFO) confirmou a regulamentação da Teleodontologia no Brasil. A medida teve como marco a publicação da Resolução CFO nº 278/2025, em 25 de novembro de 2025, que estabelece diretrizes para o exercício da Odontologia mediada por tecnologias digitais. O texto chegou a ser retirado do ar pouco depois da publicação, o que gerou dúvidas e questionamentos entre profissionais da área. Segundo o CFO, a suspensão ocorreu para ajustes técnicos no documento, que voltou a ser referendado em nova nota oficial divulgada ontem pela entidade. O avanço é considerado um passo fundamental para a inclusão das consultas odontológicas online, ampliando o acesso à saúde bucal em todo o país.
A norma regulamenta o uso de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs) no atendimento odontológico, reforçando princípios como segurança, ética profissional e autonomia do paciente. Na prática, a medida deve impactar tanto o setor público quanto o privado e a saúde suplementar.
O que muda com a Resolução CFO nº 278/2025
A nova regulamentação define a Teleodontologia como o exercício da Odontologia mediado por tecnologias digitais e autoriza modalidades como teleconsulta, teletriagem, teleorientação, telediagnóstico, telemonitoramento, teleinterconsulta, além de ações de educação e gestão em saúde bucal. O texto foi elaborado com apoio técnico da Secretaria de Informação e Saúde Digital (SEIDIGI) e da Coordenadoria-Geral de Saúde Bucal (CGSB) do Ministério da Saúde, abrindo caminho para a integração definitiva da Odontologia ao ecossistema do SUS Digital.
Outro ponto central é a exigência do cumprimento rigoroso de protocolos de segurança da informação, garantindo o sigilo dos dados clínicos e o correto armazenamento de registros, em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). A lógica é semelhante à que já vem sendo aplicada na Telemedicina desde a Lei nº 14.510/2022, que regulamentou a Telessaúde no Brasil.
“Na verdade, a odontologia estava carente disso. O texto está correto e claro”, pontua o Dr. João Paulo Tanganeli, Coordenador de Pós graduação em DTM e Dor Orofacial FCM Santa Casa SP e Membro da Associação Panamericana de Medicina Canabinoide.
Limites éticos e legais permanecem
Para o advogado Gabriel Escorcio Sabino (OAB/RJ 208.288), conhecido nas redes como @advogadodedentista, a resolução não altera o escopo da atuação profissional, apenas organiza o meio pelo qual ela pode ser exercida.
“A nova resolução da Teleodontologia não amplia e nem altera a área de atuação do cirurgião-dentista. Ela apenas regulamenta o atendimento remoto que, inclusive, já estava previsto na Lei 14.510/2022, deixando claro como a odontologia pode ser exercida por meio de tecnologia”, explica.
Segundo ele, o dentista pode, por exemplo, escutar o paciente, orientar e explicar como fatores emocionais, como estresse e ansiedade, impactam a saúde bucal, algo comum em quadros de bruxismo.
“O que o profissional não pode é ultrapassar essa linha e passar a tratar a ansiedade ou a insônia como doenças em si, pois isso fugiria do escopo da odontologia. É legítimo orientar, explicar a relação entre o emocional e a saúde bucal, encaminhar para outro profissional quando necessário e até controlar sintomas que interferem diretamente no procedimento odontológico. O que não é permitido é tratar de forma autônoma a ansiedade, como se fosse um atendimento médico ou psicológico”, reforça.
Nesta mesma linha, Dr. Tanganeli observa que o dentista pode atuar em tudo que é finalidade odontológica. “Eu não posso prescrever para um paciente ansioso para tratar a ansiedade dele. Agora, uma pré-consulta, é viável sempre. Tudo que é finalidade odontológica exclusivamente odontológica é viável assim, como o bruxismo também”, avalia.
Outro ponto sensível diz respeito à divulgação de valores. A proibição continua válida.
“A legislação que regulamenta a Odontologia proíbe expressamente o anúncio de preços de serviços (art. 7º, g da Lei 5.081/1966). Como a nova resolução não trouxe qualquer exceção, a vedação permanece, inclusive nos atendimentos remotos e nas redes sociais”, alerta Sabino.
O descumprimento dessas regras pode gerar consequências sérias. “Se o dentista extrapolar sua área de atuação, ele pode responder a processo ético perante o CRO e, dependendo da situação, até ser enquadrado em infração penal, nos termos do artigo 282 do Código Penal”, afirma o advogado. Procurado pela nossa equipe jornalística, o CFO não se pronunciou oficialmente sobre a questão de divulgação de valores em teleconsultas.
Teleodontologia e Cannabis medicinal: um paralelo possível
A regulamentação da Teleodontologia também abre espaço para um debate que vem ganhando força: o potencial de crescimento da Odontologia canabinoide a partir dos atendimentos remotos, seguindo um caminho semelhante ao trilhado pela Medicina canabinoide nos últimos anos.
Dados do Anuário da Cannabis Medicinal no Brasil, produzido pela Kaya Mind, mostra que 873.111 brasileiros utilizaram produtos à base de Cannabis em 2025, um aumento de 30% em relação ao ano anterior, consolidando o tratamento como alternativa terapêutica relevante no país. O crescimento anual consistente é impulsionado, entre outros fatores, pela ampliação do acesso à informação, à prescrição médica e ao acompanhamento remoto. A Telemedicina teve papel relevante nesse processo, sobretudo no acompanhamento de pacientes com dor crônica, ansiedade, distúrbios do sono e condições neurológicas.
Na Odontologia, o interesse pelo uso terapêutico da Cannabis também cresce, especialmente em áreas como controle da dor orofacial, inflamações, bruxismo, disfunções temporomandibulares (DTM), ansiedade associada a procedimentos odontológicos e cuidados paliativos. Embora o cirurgião-dentista não possa prescrever Cannabis para tratar doenças sistêmicas, há um campo legítimo de atuação no manejo de sintomas diretamente relacionados à saúde bucal e ao procedimento odontológico, sempre dentro dos limites legais.
Uma revisão publicada na National Library of Medicine aponta que o Canabidiol (CBD) possui propriedades anti-inflamatórias, analgésicas, antimicrobianas e osteoindutivas que podem ser relevantes para condições como dor orofacial, periodontite e infecções da cavidade oral.
Nesse contexto, a Teleodontologia pode funcionar como uma porta de entrada importante: permitindo triagens qualificadas, orientações iniciais, educação do paciente e acompanhamento de sintomas, além do encaminhamento integrado a médicos prescritores quando necessário. Trata-se de um modelo semelhante ao que já ocorre na prática da Medicina canabinoide, baseada em cuidado multidisciplinar e comunicação contínua.
Cannabis na odontologia
Apesar de a adesão dos cirurgiões-dentistas à prescrição de Cannabis medicinal ainda ser incipiente no Brasil, atualmente, apenas 0,2% dos mais de 440 mil odontologistas já realizaram esse tipo de prescrição segundo dados do Anuário, o cenário tende a evoluir. As possíveis mudanças nas normas da Anvisa previstas para 2025 abrem espaço para uma ampliação desse número em um futuro próximo. Hoje, a atuação odontológica com Cannabis ocorre majoritariamente por meio da importação de produtos via RDC 660.
Antecipando essa movimentação, a Kaya Mind realizou pesquisas primárias em eventos do setor e cruzou esses dados com levantamentos secundários em bases digitais para mapear dentistas que já atuam com terapias canabinoides. A partir desse trabalho, foi possível identificar mais de 800 profissionais, concentrados principalmente na região Sudeste do país. Os dados indicam que a Odontologia canabinoide começa a se estruturar como um novo nicho de mercado, com atores, demandas e produtos próprios, que tendem a se especializar e ganhar relevância nos próximos anos.
Democratização do acesso e futuro da Odontologia
Ao integrar a Odontologia, o CFO sinaliza um avanço estrutural na política pública de saúde bucal. Em um país marcado por desigualdades regionais, a possibilidade de orientação e acompanhamento remoto tende a beneficiar tanto pacientes quanto profissionais, reduzindo deslocamentos desnecessários e ampliando o alcance da atenção especializada.
Para a Odontologia canabinoide, o cenário é promissor, desde que acompanhado de formação técnica, clareza regulatória e responsabilidade ética. Assim como ocorreu na Medicina, a tecnologia pode ser uma aliada para informar, acolher e acompanhar pacientes, sem substituir o atendimento presencial, mas complementando-o.
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Como começar um tratamento com Cannabis?
Aqui no Brasil, o uso medicinal da Cannabis é possível desde que tenha a prescrição de um médico ou dentista. Acessando a nossa plataforma de agendamentos você pode marcar uma consulta com um profissional da saúde experiente na prescrição desse tipo de tratamento.













