Na última quarta-feira, reunimos pacientes de todo o Brasil para uma conversa ao vivo sobre um tema pouco falado, mas imprescindível: o corpo precisa estar preparado para responder à terapia canabinoide.
“Como que a terapia canabinoide vai equilibrar um corpo que, por si só, tem outros fatores que já o desequilibram?”, perguntou o médico convidado Dr. Gabriel Campos. Por isso, o profissional defendeu uma abordagem integrada: desinflamar, desintoxicar, organizar rotina e só então potencializar os efeitos da Cannabis.
Direto de Brasília (DF), o Dr. Gabriel, que conta com pós-graduações em nutrologia, dermatologia, prática ortomolecular, homeostase hormonal e prevenção de doenças relacionadas à idade, relatou que já acompanhou mais de mil pacientes em abordagens integrativas com fitocanabinoides.
“Eu fico mais feliz ainda de poder tentar ajudar um pouco com conhecimento e agregar para as pessoas abrirem mais a mente sobre o uso terapêutico da Cannabis e as diversas indicações que tem no mundo atual”, afirmou o médico logo no início da live.
Por que alguns pacientes têm respostas impressionantes e outros nem tanto?
Uma das primeiras perguntas foi direta: por que algumas pessoas têm resultados rápidos e transformadores com a Cannabis medicinal, enquanto outras nem tanto?
“Cada um de nós possui o sistema endocanabinoide, porém ele está sujeito a fatores do estilo de vida, principalmente ao estresse, à alimentação, à falta de exercício, ao sono”, explicou o Dr. Gabriel.
Além disso, entram em cena fatores genéticos. Hoje já existem testes genéticos que avaliam como são os receptores canabinoides de cada pessoa, ajudando o médico a entender por que alguns pacientes não respondem de imediato e como ajustar dose e tipo de óleo de Cannabis.
Mas, para o médico, a genética não é o fator decisivo no dia a dia do consultório:
“O principal fator que eu considero hoje não é genético. O que mais interfere no sistema endocanabinoide é toda a epigenética do paciente. Então, muitos fatores do estilo de vida.”
Sono ruim, dieta inflamatória, sedentarismo, excesso de toxinas, estresse crônico e uso de múltiplos medicamentos podem “desligar” ou atrapalhar o sistema endocanabinoide. A Cannabis chega como estímulo, mas encontra um organismo exausto, inflamado e desconectado dos próprios ritmos.
O que é o sistema endocanabinoide?
Para quem está começando, o conceito pode parecer abstrato. O Dr. Gabriel gosta de explicar a partir do próprio nome:
“Endo significa do próprio corpo, e canabinoide significa semelhante à Cannabis.”
Temos, em praticamente todo o organismo, receptores endocanabinoides prontos para receber tanto as moléculas produzidas pelo corpo (endocanabinoides) quanto os fitocanabinoides vindos da planta Cannabis. Ele pontuou os principais receptores:
- CB1 – mais concentrados no cérebro e sistema nervoso central
- CB2 – mais presentes em estruturas do sistema imune, como linfonodos, baço e timo
“Desde que se descobriu que existem esses receptores e que eles têm semelhança molecular com um fitocanabinoide presente na planta, a gente sabe que o fitocanabinoide consegue se encaixar nesses receptores do corpo e promover um efeito terapêutico”, explicou.
Todos nós, do recém-nascido ao idoso, temos esse sistema funcionando naturalmente, principalmente por meio dos endocanabinoides anandamida e 2-AG. O que muda é o número de receptores, as enzimas que produzem e degradam esses endocanabinoides, a genética de cada indivíduo. E, sobretudo, o estilo de vida que pode fortalecer ou sabotar esse sistema.
Sono, ciclo circadiano e Cannabis: muito além de “dormir melhor”
Neste sentido, uma das perguntas do público foi se um ciclo circadiano desregulado pode alterar o sistema endocanabinoide. “Sim, com certeza”, respondeu o médico. Ele usou como exemplo profissionais que fazem plantão noturno e privam o sono. Isso aumenta o cortisol, hormônio do estresse, que por sua vez interfere na enzima que degrada a anandamida:
“Esse cortisol em excesso acaba fazendo reduzir o nosso endocanabinoide natural, que chama anandamida.”
Na prática, cortisol alto à noite atrapalha a produção de melatonina, bagunça o sono, a regeneração e a homeostase metabólica, hormonal e imunológica.
Segundo o médico, nesses casos, a Cannabis pode ajudar – especialmente CBD e CBN, e, em alguns casos, pequenas doses de THC:
“O CBD e o CBN vão ajudar a regular a dopamina, modular a melatonina, modular neurotransmissores como a serotonina. Consequentemente, promovem um efeito ansiolítico e melhoram a qualidade do sono, ajudando o paciente a entrar no sono REM e depois no sono profundo.”
Ele relatou ampla experiência clínica em desmame de benzodiazepínicos e indutores de sono
“É uma das coisas que eu mais faço: desmamar pacientes com uso de benzodiazepínicos, indutores do sono e antidepressivos. Esses medicamentos não atuam na homeostase do corpo. Não existe receptor no corpo para diazepam, alprazolam ou gabapentina.”
O caminho que ele propõe é associar, por um tempo, o óleo de Cannabis aos remédios alopáticos e ir reduzindo gradualmente a medicação de tarja preta, enquanto ajusta a dose de fitocanabinoides – sempre junto de higiene do sono:
- dormir antes das 22h
- reduzir luzes e telas
- afastar o celular
- meditação, oração ou leitura
- chás calmantes, como camomila
- aromaterapia (lavanda)
- evitar cafeína, energéticos e refeições pesadas à noite
“Tem uma série de fatores que a gente precisa trabalhar em conjunto com a Cannabis medicinal”, reforçou.
Artrite reumatoide, dor crônica e o papel da Cannabis como coadjuvante
Uma participante relatou que busca aliviar as dores da artrite reumatoide e, se possível, abandonar o corticoide. O Dr. Gabriel foi direto:
“A artrite reumatoide é uma doença inflamatória das articulações e muitas vezes autoimune. O próprio sistema imune está em desequilíbrio.”
Ele lembra que 80% do sistema imunológico está no intestino. Se o intestino não funciona bem, a resposta à Cannabis será limitada:
- intolerâncias alimentares
- mimetismo molecular
- reação inflamatória a glúten, lácteos e grãos
- disbiose intestinal
Para o médico, a Cannabis pode ser usada em conjunto com o corticoide, especialmente pela ação analgésica, anti-inflamatória e imunomoduladora.
“A Cannabis vem como mais uma ferramenta coadjuvante para aliviar dor e desinflamar, pode ser feita em conjunto com o corticoide, mas muitas vezes o que a gente quer é ir desmamando o corticoide enquanto cuida da raiz do problema, que é o intestino.”
O mesmo raciocínio vale para quadros como fascite plantar, em que a combinação de óleo oral e creme tópico de Cannabis pode aliviar a dor e modular citocinas inflamatórias, enquanto outras causas – ortopédicas, metabólicas e nutricionais – são investigadas e tratadas.
Alimentação, gorduras boas e o fim da “gordurofobia”
Quando o assunto é dieta, o médico é categórico: sem gorduras boas, o sistema endocanabinoide não funciona bem. “O sistema endocanabinoide depende de ácidos graxos para funcionar. Eles vêm do metabolismo das gorduras. As pessoas precisam perder o medo de comer gordura – claro, estamos falando de gordura saudável.”
Ele cita como base alimentar:
- carnes em geral
- ovos
- frutas e verduras
- óleos de boa qualidade, como os do coco e de fontes naturais
“Se o paciente continuar consumindo muitos alimentos processados, inflamatórios, fast food, isso com certeza piora o sistema endocanabinoide e dificulta os efeitos terapêuticos quando utilizamos um óleo.”
Ele lembra que o próprio óleo de Cannabis costuma vir em veículo TCM (óleo de coco), rico em triglicerídeos de cadeia média, que já ajudam a sintetizar anandamida e 2-AG. Para ele, tratar a “gordurofobia” é parte da missão na consulta.
Intestino, segundo cérebro e chave para ansiedade, dor e metabolismo
O intestino aparece o tempo todo como protagonista na fala do médico. Não é à toa que ele é chamado de “segundo cérebro”.
“O sistema gastrointestinal é responsável por cerca de 80% do nosso sistema imune e também pela produção de serotonina, um dos principais neurotransmissores do bem-estar.”
Quando a alimentação é rica em açúcar, trigo, carboidratos refinados, processados e gordura trans, há prejuízo na produção de serotonina e desorganização do microbioma intestinal. Surge a disbiose, que ele chama de “porta de entrada” para doenças crônicas:
- depressão
- ansiedade
- doenças neurodegenerativas, como Alzheimer e Parkinson
- dor crônica e inflamação sistêmica
“Nove em cada dez pacientes que eu atendo têm disbiose. É algo cada dia mais presente pela alimentação industrial do mundo moderno.”
Tratar o intestino, às vezes com desintoxicação, reposição de probióticos, fibras e eliminação de parasitas, é, para ele, fundamental para melhorar a conexão intestino–cérebro–sistema endocanabinoide e, assim, a resposta à cannabis.
Fibromialgia, mitocôndrias e óleo full spectrum
Para um participante com fibromialgia, o Dr. Gabriel recomenda, na maioria dos casos, começar com um óleo full spectrum:
“Inicialmente, a gente utiliza um óleo full spectrum, predominante em CBD, mas que tem outros fitocanabinoides, terpenos e flavonoides para gerar o efeito entourage, o efeito comitiva.”
Dependendo da resposta, é possível ajustar a proporção de THC, já que ele tem efeito analgésico mais potente. Mas, de novo, a Cannabis não vem sozinha. O médico lembra que a fibromialgia é, em muitos casos, uma mitocondriopatia:
Por isso, ele associa:
- dieta rica em gorduras boas
- nutrientes como coenzima Q10, magnésio, L-carnitina e D-ribose
- desintoxicação
- movimento e atividade física
“Quando o paciente entende que também precisa mudar o estilo de vida, desinflamar pela alimentação, praticar atividade física… aí, somando forças, o resultado é maravilhoso”, relata.
Movimento é remédio e potencializa a Cannabis
A live também reforçou o papel do exercício físico. E o Dr. Gabriel reforçou que o sedentarismo gera inflamação. “Se a gente não coloca o sistema musculoesquelético para trabalhar, as mitocôndrias vão ficar doentes.”
Ele explica que o exercício:
- melhora saúde cardiovascular e osteomuscular
- aumenta endorfinas e bem-estar
- modula o próprio sistema endocanabinoide
- ajuda a organizar o ciclo circadiano
- favorece exposição ao sol e produção de vitamina D
“O exercício já faz o sistema endocanabinoide regular mais, ficar melhor. Quando a gente administra o fitocanabinoide, potencializa os efeitos.”
Câncer: qualidade de vida, não “cura milagrosa”
Uma das dúvidas frequentes é sobre o uso de Cannabis em pacientes com câncer. O médico é claro: “A Cannabis não cura o câncer. Isso é claríssimo.”
Mas isso não significa que ela não tenha um papel importante. Em associação com quimioterapia e radioterapia, a Cannabis pode:
- potencializar efeitos dos tratamentos convencionais
- reduzir inflamação
- melhorar dor
- resgatar apetite e peso
- ajudar humor, cognição e qualidade de vida
O THC ganha destaque nesse contexto:
“O THC tem mais efeito apoptótico, ajuda o sistema imune a ir lá e fagocitar as células cancerígenas. Ele tem um efeito antineoplásico e também anti-inflamatório.”
Por ser psicoativo, o médico costuma combinar THC com CBD, para modular possíveis efeitos indesejados, ajustando titulação e dose de forma individualizada.
“É coadjuvante no processo. O paciente não deve deixar de fazer o tratamento convencional. Mas a cannabis é muito bem indicada para casos de câncer, principalmente quando pensada dentro da visão do todo.”
Saúde mental, bipolaridade e o próprio médico como paciente
A saúde mental é outra área em que o Dr. Gabriel vê grande potencial, inclusive em condições como bipolaridade:
“Pode ajudar a modular essa bipolaridade do comportamento e deixar o paciente mais centrado. Nesse caso, um dos óleos mais utilizados é o CBG, o canabigerol, que é o que mais penetra a barreira hematoencefálica e ajuda na neuroinflamação.”
Ele explica que o CBG auxilia a regular dopamina, acetilcolina, serotonina e GABA – neurotransmissores muito envolvidos na bipolaridade.
O momento mais emocionante da live, porém, foi quando o médico compartilhou a própria história
“Eu sempre dou o meu exemplo pros pacientes. Eu tenho diagnóstico de TDAH, transtorno do déficit de atenção e hiperatividade. A vida inteira eu fui tratado com alopatia. Usei Ritalina muitos anos, cheguei a usar Venvanse.”
Depois de fazer exame genético e cuidar da “epigenética”, sono, alimentação, movimento, ele introduziu a Cannabis medicinal:
“Depois que eu associei o óleo de Cannabis, o óleo potencializou a questão do meu estilo de vida. Melhorei muito a hiperatividade, fiquei mais focado, mais concentrado, meu desempenho cognitivo e meu humor melhoraram, meu sono também. Nunca mais usei Ritalina nem Venvanse.”
Hoje ele usa dois esquemas de óleo:
- de dia: CBD + CBG, sem THC
- à noite: um blend com CBD, CBG, CBN e um pouco de THC para modular sono e ciclo circadiano
“Eu sou prova viva disso”, resume. “Melhorei imunidade, dores, sono e desempenho. Há muitos pacientes órfãos de terapêutica por preconceito com o óleo, sem saber de todos esses efeitos.”
Ao final da live, o médico relatou como enxerga a terapia canabinoide nos próximos cinco anos no Brasil. “Não tem como negar que a Cannabis pode ajudar inúmeras patologias. Já tem mais de 30 mil estudos científicos. No último congresso que eu fui, tinham médicos de 14 países falando sobre o uso terapêutico da Cannabis.”
Para ele, o grande desafio agora é reduzir o preconceito dentro da própria medicina, com mais médicos estudando, prescrevendo com responsabilidade e construindo experiência clínica.
“Eu vejo a Cannabis como um suplemento, um nutriente para prevenir doenças no futuro, se for associada à nutrição, exercício, sono, controle do estresse e equilíbrio hormonal.”
Ele também mencionou o avanço de fitocanabinoides específicos, como o THCV, que vem ganhando espaço em estudos sobre diabetes, resistência insulínica, síndrome metabólica e obesidade. Ao falar de regulação, o médico lembrou que tudo é feito de forma regulamentada pela Anvisa desde 2017, com dezenas de empresas autorizadas a importar óleos, além de associações de pacientes que produzem produtos regularizados no Brasil: “É um mundo que a gente está vivendo agora, com um norte enorme pela frente em termos de novidades”, finalizou.
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Como começar um tratamento com Cannabis?
Aqui no Brasil, o uso medicinal da Cannabis é possível desde que tenha a prescrição de um médico ou dentista. Acessando a nossa plataforma de agendamentos você pode marcar uma consulta com um profissional da saúde experiente na prescrição desse tipo de tratamento.

















