Na última quarta-feira (06/11), aconteceu, em São Paulo, o Cannabis Connection, evento que reuniu importantes nomes do setor para debater o futuro do mercado brasileiro. Empresários e representantes de órgãos reguladores participaram das discussões, abordando tópicos como a expansão do mercado, regulamentação e entraves que ainda precisam ser superados.
Durante o evento, foi apresentada uma retrospectiva, que destacou os principais avanços no setor em 2024. Entre eles, a inclusão do Canabidiol na lista de produtos oferecidos pelo SUS em São Paulo e a permissão para prescrição de produtos à base de Cannabis para animais. Avanços que fortalecem a segurança regulatória e ampliam as opções terapêuticas.
A indústria também fez progressos significativos com a Anvisa, aprovando o primeiro extrato de Cannabis produzido no Brasil, destinado ao tratamento de demência, fibromialgia e dor crônica. Antes de tudo, isso abre caminho para o fortalecimento do mercado interno e maior acessibilidade para os pacientes.
Além disso, a retrospectiva abordou o debate sobre a regulamentação, que se intensificou com divergências entre setores, como o pedido para a revisão da Resolução RDC-660 da Anvisa.
Cannabis medicinal em 80% dos municípios brasileiros
Com foco nas importações, a Kaya Mind, empresa de inteligência de mercado no setor de Cannabis, apresentou um panorama do crescimento no número de pacientes de Cannabis medicinal no País.
A empresa destacou a evolução do mercado nos últimos anos, com uma projeção de crescimento contínuo. Além disso, também detalhou o aumento na importação de produtos, reforçando uma ampla adesão a essa alternativa terapêutica no Brasil.
De acordo com os dados, aproximadamente 80% dos municípios brasileiros já contam com pelo menos um paciente em tratamento com Cannabis medicinal. Nota-se ainda um crescimento nas prescrições feitas por médicos em regiões fora das capitais, o que reforça a capilaridade e o alcance dessa prática no país.
Ainda de acordo com a Kaya Mind, hoje, todas as especialidades médicas reconhecidas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) já prescrevem produtos à base de Cannabis, o que evidencia a crescente confiança e aceitação desse iipo de tratamento no Brasil.
A importância da educação médica continuada
A CloseUp, consultoria também especializada em inteligência de dados, trouxe importantes informações sobre a RDC 327, que regula a comercialização de produtos à base de Cannabis em farmácias no Brasil.
Durante a palestra, Natália Soares, Business Strategy Manager da Close-Up International Brasil, ressaltou o crescimento do mercado e a velocidade com que esse segmento tem se expandido.
De acordo com a CloseUp, as vendas de produtos à base de Cannabis apresentaram um crescimento acumulado de 106%. Outro dado interessante é que, em 2024, pela primeira vez, as prescrições de medicamentos antidepressivos e ansiolíticos superaram aquelas para doenças cardíacas, um reflexo direto da crescente preocupação com a saúde mental.
Contudo, a palestrante também enfatizou que, embora o mercado de Cannabis seja promissor, ainda está em uma fase inicial, se comparado ao mercado de medicamentos tradicionais.
“O mercado ainda é tímido se comparado ao dos antidepressivos, que movimentam bilhões de dólares. No entanto, o Canabidiol já mostra um crescimento notável e esperamos que, com a educação correta, esse cenário se inverta”, comentou.
A especialista ressaltou ainda a importância da educação médica continuada, para que os médicos possam integrar adequadamente o uso de Cannabis em suas práticas. Para ela, é essencial que os profissionais da saúde se atualizem sobre as pesquisas mais recentes, sobre as dosagens e as possíveis interações com outros medicamentos.
“É um campo em expansão e é vital que os médicos compreendam as nuances do tratamento com cannabis, ajustando-o conforme as necessidades específicas de cada paciente.”
Cannabis Connection: caminhos e desafios no debate da regulamentação
O debate sobre os caminhos da Cannabis no Brasil gerou intensas discussões sobre os avanços e desafios na regulamentação no país. Mediado por Pedro Pierro, diretor científico do Sechat, o painel contou com a presença de Cláudio Mitidieri, Secretário de Saúde de Sergipe, Daniela Arquete, da Anvisa, e Daniela Bitencourt, da Embrapa.
Daniela Arquete, da ANVISA, destacou os avanços na regulamentação dos produtos à base de Cannabis, como a RDC 327/2019, que oferece regras para a comercialização. Ela enfatizou que, apesar de progressos, a regulamentação ainda está em processo de evolução, refletindo o caráter transitório da categoria.
A Secretária de Saúde de Sergipe apresentou os avanços do estado na implementação de protocolos para o uso medicinal de Cannabis, incluindo o tratamento de epilepsia refratária e distúrbios comportamentais em pacientes com transtorno do espectro autista. Sergipe tornou-se um exemplo, ao oferecer tratamentos gratuitos pelo SUS, com acompanhamento de uma equipe multiprofissional, que já beneficiam dezenas de pacientes.
Foco em pesquisa e acessibilidade
Por fim, Daniela Bittencourt, da Embrapa, abordou a importância da pesquisa científica no desenvolvimento de Cannabis no Brasil. Ela ressaltou o potencial do país para liderar a produção e o cultivo de Cannabis medicinal, destacando a atuação da Embrapa em projetos que envolvem a biotecnologia e a edição gênica da planta.
Embora progressos tenham sido feitos, como o avanço da legislação e as pesquisas científicas, o setor ainda enfrenta obstáculos regulatórios e culturais, que precisam ser superados. Como destacou Bittencourt, “somos o país do agro e não há razão para não utilizarmos todo o nosso potencial para cultivar Cannabis e oferecer acesso ao SUS de forma eficaz”.
A busca por uma regulamentação clara e eficaz, com foco em pesquisa e acessibilidade, se mantém como prioridade para os envolvidos no debate. O que está em jogo é a capacidade do Brasil de consolidar-se como líder na produção de Cannabis medicinal, ao mesmo tempo que garante o acesso controlado e seguro para os pacientes que dependem dessa terapia.